Monday, November 30, 2009

O amor tem duas cores


Começou nem me lembro quando. As mais antigas recordações remetem mais ou menos aos meus quatro anos. Todo mundo se reunia lá em casa pra ver o jogo. Todos os amigos dos meus pais. Até mesmo tio Paulinho, que é tricolor (aliás, talvez um dos maiores desgostos da vida dele tenha sido a conversão do Rafael a rubro-negro). Entre uma roda de violão e um jogo de totó (no qual sempre defendi com louvor o Flamengo, desbancando qualquer marmanjo, mesmo que ele quisesse usar golpes baixos como o proibido "ventilador"), comemorávamos gols de Zico, Junior, ou até mesmo Bugica. Chorei com o título de Penta como só chorei novamente depois de velha, por encontrar um amor.
Passaram-se anos e a inexplicável paixão só crescia. Tudo bem gostar de gente, bichos, mas amar um time? Sofrer de verdade quando ele perde? Sentir que um gol de barriga é mais doloroso que joelho ralado? Precisava descobrir isso a fundo.
Foi quando chegou meu segundo amor. Chamava-se Vitória Futebol Clube. Vitorinha, pros íntimos. Eu ia ao estádio com meu pai todos os domingos. E se havia jogos na quarta-feira me postava do lado de fora do portão do colégio no fim da tarde e, assim mesmo, de uniforme, ia pro gigante de Bento Ferreira. Lá encontrava uma porção de amigos e tantos outros que mais pareciam lendas-vivas. O gordão que, dizia-se, havia matado um poodle com um pisão. O magrelo que comia churrasquinho de gato sem parar. Ou mesmo o craque Osni, que de tão pequeno fazia a blusa do time parecer de manga comprida. Teve até o dia em que reclamei dele aos berros e ouvi um pai desconcertado pedir pra eu parar, porque ouvir a gente falar que o filho era o maior pereba machucava demais.
Mas o Vitória nunca era campeão. Pelo contrário. Cheguei a ver jogos tenebrosos quando o time desceu pra segunda divisão do estadual do Espírito Santo. Dá pra imaginar? Vi maqueiro derrubar jogador, técnico bater em juiz e cada lance! O mais impressionante era que o estádio estava sempre lotado. Pra ver aquilo? E por que eu continuava indo? Por que continuava sofrendo com cada derrota? Por que via derrota atrás de derrota e continuava apaixonada? Por que trocava o shopping com a amigas por uma ida ao estádio do Colatinense em dia de chuva? Era o jogo? Eram as pessoas?
Fui morar no Rio e lá ia eu, em plena quarta-feira, de ônibus, ver Flamengo e Olaria. Domingo era regra. Vi o campeonato, o bi, o tri em cima do Vasco, o gol de falta do Pet, tomei bandeirada na cabeça, corri quando a "panela de pressão", entre a Jovem e a Raça, resolveu explodir, comi muito biscoito Globo e tomei cerveja no copo plástico. É claro que a farra vale a pena, por si só. É claro que amo futebol, sempre soube o que era impedimento e sou até capaz de fazer análises táticas bem atrevidinhas. Mas o que nos move é mesmo o amor. Amor que me fez cair no choro sozinha em casa no último domingo vendo o Flamengo fazer um primeiro tempo cheio de garra e um segundo inteligente, administrando o resultado (coisa que a gente nem sempre vê no mais querido). Vontade de comprar uma passagem e sair correndo pra casa, pra ver a festa.
Aqui de longe, comemoro os bons presságios. Este ano o Vitória foi campeão (da série B, porque da série A ja seria demais, né, gente!) , o uniforme do Vitorinha é azul, como o do Grêmio, que o Flamengo enfrenta no domingo, e até mesmo rivais estão torcendo, em respeito a um dos melhores campeonatos de todos os tempos. Tão emocionante que tirou de vez minha birra com os pontos corridos. Só resta acender uma velinha e dormir feliz por ter escolhido tão bem. Vai haver mais um baile no Maracanã. 

3 comments:

Fabiano said...

que texto bom!
flamengo hexacampeão, não vou aguentar ficar no rio no domingo... pra não aturar a favelada, acho que vou me refugiar tipo... em belém, sei lá!

Rafael Cesar said...

Vivendo, aprendendo e se surpreendendo! Nunca poderia imaginar que você fosse apaixonada por essa coisa chamada futebol(rs). Só quem ama mesmo pra compreender. Adorei essa história do Vitorinha, que mesmo caindo para segundo divisão do Espírito Santo, o amor continua, mas é assim mesmo, amor pelo time não tem divisão. Moro no Rio e mesmo não sendo flamenguista, tenho certeza que você adoraria estar na cidade no domingo. E no dia seguinte ?? Acho que só eu não estava com camisa do flamengo na cidade(rs). Mas quem sabe ano que vem você não posso curtir isso, se meu time não tivesse na libertadores, desejaria boa sorte para vocês, mas como está, então fica difícil, falar isso(rs). Mas cá entre nós, mesmo com meu time também já tendo ganho pontos corridos, eu ainda prefiro mata-mata. Tem muito mais emoção, sem contar que eu estava com receio de acontecer no brasileiro, o que aconteceu no campeonato francês, um time ganhar 7 ou 8 anos seguidos.
Hoje me surpreendi positivamente com esse seu lado futebolístico que desconhecia. Beijão Mila

João Dias said...

Olá Dra. Mila

A única coisa que estrega em você é essa camisa. Brincadeira cada um torce para o time que se identifica. Parabéns pelo seu trabalho NY tenho acompanhado pelos nossos amigos da Globo Rio. Um abraço e muito sucesso.